[Crítica] Confinado (2025)
Confinado é baseado no longa argentino 4×4, de 2019. Os dois filmes envolvem um ladrão que tenta roubar um carro luxuoso e fica preso no veículo cheio de tecnologia. Não assisti ao filme argentino, por isso não vou focar aqui em comparações entre as duas obras.
Aqui, o ladrão Eddie Barrish (Bill Skarsgård) é capturado por William (Anthony Hopkins), um médico milionário e em estado terminal, que decide aplicar sua própria forma de justiça. Eddie tenta conseguir dinheiro em golpes para recuperar seu carro na oficina e se culpa por não conseguir ser o melhor pai para sua filha Sarah (Ashley Cartwright). Eddie é o produto de um sistema desigual que empurra os mais fracos para a margem.
A sua ex-esposa reclama por ele não ter ido buscar a filha no colégio e ele, que genuinamente ama a menina, se envergonha e tenta melhorar. Eddie se depara com um carro super luxuoso em um estacionamento quase vazio, entra e descobre que as portas não destravam, os vidros não quebram, o sinal do celular não funciona…

Do outro lado da história, William, um médico extremamente rico mas doente terminal, controla à distância tudo o que acontece dentro de seu carro. Os dois personagens não se conheciam. Mas William já foi vítima de roubos antes e, por isso, preparou o seu veículo para virar essa “arma” contra o próximo que tentasse lhe roubar.
O filme propõe um embate ideológico entre duas perspectivas: a de quem sobrevive à margem, sem acesso a recursos nem chances de mudança, e a de quem observa a decadência do mundo de cima, convencido de que a degeneração moral se combate com punição. Os diálogos entre os dois personagens emulam uma batalha simbólica entre classes sociais.

Confinado tem cenas difíceis de assistir. Vemos, a cada cena, Eddie se desintegrar aos poucos. Há alguns breves momentos de esperança, para logo vir uma rasteira. Bill Skarsgård entrega uma performance que transmite uma gama impressionante de emoções e é difícil não torcer para ele se dar bem e conseguir fugir dali. O ator carrega o filme nas costas, já que aparece na tela durante praticamente todo o longa. Carregar um filme inteiro sozinho não é tarefa fácil, e ele consegue.
Anthony Hopkins, mesmo aparecendo fisicamente apenas no terceiro ato, domina com sua voz e presença. Seu personagem consegue prever quase todas eventualidades e que não se abala com o sofrimento físico do outro. Em vez de matar, a intenção de William é atormentar e fazer Eddie sofrer. Inicialmente, temos a presença dele apenas por voz. No terceiro ato, quando ele aparece fisicamente, seu personagem ganha mais força e doses extras de sadismo.

Apesar de conseguir prender a atenção e entreter, Confinado não é tão bom quanto poderia. Não chega a ser um terror, também não é perspicaz ou profundo o suficiente para ser um estudo de personagem. Por ser um filme quase que inteiramente no interior de um carro, ele acerta em conseguir manter a atenção e a imprevisibilidade para quem assiste.
Confinado tenta transformar Eddie em herói e seu encontro com William tem um efeito de fazê-lo apreciar mais a vida e tentar ainda mais ser melhor. Eddie é os olhos e ouvido do público. Para o filme funcionar, o personagem e sua atuação precisam funcionar bem. E funcionam. A intensidade no seu olhar, a agonia e o desespero faz com que a gente consiga sentir um pouco do que aquele personagem está passando. Skarsgård é certamente o ponto alto do filme.

A direção de David Yarovesky mantém o ritmo intenso do filme e a fotografia de Michael Dallatorre acerta ao criar uma atmosfera sufocante. Hopkins adiciona camadas com um tipo de personagem que domina, articulado e ameaçador. Skarsgård entrega uma performance visceral cheia de ansiedade, desespero e transformação.
O final chega de forma abrupta, contrastando com a construção gradual, e é o que mais enfraquece o filme. Enquanto durante toda a duração de Confinado a narrativa foi sendo criada aos poucos e as coisas se desenrolaram de forma gradativa, prendendo nossa atenção e nos fazendo torcer por Eddie, o final corre. Também há alguns tropeços no roteiro, como diálogos um pouco caricatos, mas mesmo assim o filme se sustenta e não se perde.

Confinado é uma jornada eletrizante e intensa do início ao fim. Cheguei sem saber bem o que esperar e convencida a assistir apenas pela presença dos dois atores principais que são ótimos, e saí da sala de cinema bem satisfeita. Tem uma história simples e previsível, mas intensa e capaz de prender a atenção e provocar diversas reações.
Confinado mistura crítica social, tensão psicológica e ação em um espaço claustrofóbico. É uma produção inteligente, provocadora e emocionalmente carregada, que usa o formato de “justiça com as próprias mãos” para ir além do convencional e discutir as falhas do mundo real. Não aprofunda tanto quanto promete, mas entretém – e, acima de tudo, se sustenta pelo talento de seus protagonistas.
