[Crítica] Está Tudo Bem Comigo? (2022)
Lucy (Dakota Johnson) e Jane (Sonoya Mizuno) são melhores amigas. As duas estão na casa dos 30 anos e se conhecem há muito tempo. E a primeira cena de Está Tudo Bem Comigo? já demonstra isso. Jane consegue recitar o pedido de sempre de Lucy no restaurante: hambúrguer vegetariano e batata doce frita. Elas terminam as frases uma da outra.
Se não fosse o fato de explorar a descoberta da sexualidade e do romance lésbico na narrativa mais tardiamente do que o cinema está acostumado a retratar, talvez o filme não seria inovador e poderia passar batido. Mas, além de ser bem agradável de assistir, o filme também se destaca positivamente no gênero coming of age de uma mulher de 32 anos que se descobre lésbica. Se hoje histórias de personagens LGBTQIA+ ainda não são tão frequentes no cinema, são ainda menos se procurarmos uma obra com uma personagem principal como Lucy. A descoberta aqui acontece uma ou duas décadas mais tarde do que na maioria das histórias que vemos. É o primeiro filme assim que assisti.
O fato da jornada de autoconhecimento de Lucy acontecer tardiamente pesa. As possibilidades do mundo são diferentes para ela. Ela não está iniciando a vida e não sente que tem tudo de novo pela frente. Ela já trabalha – ainda que não naquilo que ama -, suas amizades já estão bem estabelecidas. Mudar parece mais difícil. Tudo ganha um novo tom. Ela levava uma vida acomodada, sempre pedia o mesmo hambúrguer vegetariano e a mesma batata doce frita com café preto gelado no restaurante. Sai com sua melhor amiga, vive uma vida tranquila, nunca se apaixona. Foge de encontros românticos com homens.

O seu início tardio de relacionamento com mulheres pode ser algo novo e não tão explorado pela indústria cinematográfica, mas é algo comum na vida real. E retratar isso é um dos pontos fortes do filme. O filme também serve como uma bandeira para mulheres que têm medo de explorar os seus sentimentos e vontades sobre outras mulheres e faz com que se sintam vistas.
O filme é realista ao mostrar toda a trajetória de Lucy, desde quando assume o seu desejo por outras mulheres, passando pelas primeiras experiências até a aceitação. São muitos momentos de frustração, vulnerabilidade, estranheza, questionamentos e dúvida. Ela tenta respeitar o seu ritmo. E sofre constantemente. É como se o filme colocasse luz em vários momentos que mulheres podem sofrer em segredo. Dakota Johnson interpreta essa protagonista de forma maravilhosa, sutil e firme.

Além de toda a jornada de autoconhecimento de Lucy, outro grande foco do filme – eu diria que o principal – é a sua amizade com Jane. Quando Lucy confessa que gosta de mulheres, ela recebe total apoio de Jane. A amiga incentiva Lucy a viver plenamente o seu desejo, leva a amiga para bares lésbicos, incentiva romances. Mas, ao longo do filme, as duas acabam se desentendendo e se afastam.
O filme tem cenas simples, mas muito boas, como quando Lucy pesquisa no Google e faz um quiz sobre “Como posso saber se sou lésbica”, e cenas mais doloridas, como quando Lucy sente que uma mulher heterossexual está brincando com seus sentimentos. Todo o realismo do filme fica claro, já que ele é uma criação semi-autobiográfica da roteirista Lauren Pomerantz. A história do filme é baseada na sua própria história. A roteirista se assumiu aos 34 anos. O filme é dirigido pelo casal Tig Notaro e Stephanie Allynne. Está Tudo Bem Comigo? estreou no Festival de Sundance de 2022.

Dakota Johnson, Sonoya Mizuno e Kiersey Clemons estão cativantes em cada cena. Está Tudo Bem Comigo? é um coming of age doce, singelo, reconfortante e agradável de assistir, com um final muito fofo. Mas mais que uma história da jornada individual de uma lésbica se descobrindo, é uma história sobre amizades adultas. Também é um filme sobre autodescoberta, autoaceitação e relacionamentos.
