[Crítica] O Quarto ao Lado (2024)
O Quarto ao Lado é o primeiro longa-metragem de Pedro Almodóvar totalmente em língua inglesa. No filme, Ingrid (Julianne Moore) e Martha (Tilda Swinton) foram amigas íntimas na juventude. Ingrid virou uma romancista famosa e Martha virou correspondente de guerra. As duas não se viam há muito tempo. Mas, assim que Ingrid descobre que Martha está sofrendo de um câncer terminal, faz uma visita ao hospital. E então a acompanha até o fim.
O filme é contido, introspectivo e muitas vezes parece não ter tanta coisa acontecendo, porque a maioria dos acontecimentos está nos detalhes e nas entrelinhas. E por isso ele é tão comovente. Mais que um argumento a favor da eutanásia, o novo filme de Almodóvar propõe um olhar humanista e empático sobre a vida, sobre reencontro e sobre lealdade. A tragédia é iminente, sabemos desde o início qual é o destino de Martha. Mas, até lá, há espaço para humor, para compreensão e para cumplicidade, sempre com um olhar gentil e cativante.

Durante O Quarto ao Lado, Ingrid e Martha partilham momentos de felicidade, relembram o passado, vivem a amizade no presente, testemunhando o fim iminente, mas vivendo apesar dele. Ingrid não sabe quando Martha decidirá que sua vida chegou ao fim, por isso a tensão sempre está no ar. É como se elas estivessem presas em um limbo, mas buscando fazer o melhor que podem durante esse tempo de espera. Elas estão vivendo o presente, tentando aproveitar os momentos finais de Martha, ao mesmo tempo em que parecem estar à margem da realidade, isoladas em uma casa distante, alugada justamente para servir de palco para o fim.
Além de ser um forte argumento favorável à eutanásia, O Quarto ao Lado também fala sobre a extrema direita, sobre fundamentalismo religioso, sobre liberdade sexual, independente de gêneros, e sobre o colapso ambiental em que vivemos atualmente. O filme tem um olhar temeroso quanto ao nosso futuro. Todos esses temas são abordados, embora não sejam tão aprofundados assim – e acredito que o foco do filme não era mesmo aprofundá-los, como quando o policial fundamentalista religioso interroga Ingrid em uma cena rápida, mas que consegue causar impacto.

O Quarto ao Lado é um filme feito para emocionar e para instigar reflexão sobre vida e morte. O filme consegue cumprir o que se propõe, com a habilidade de Almodóvar de filmar rostos e captar emoções em todas as suas nuances, dirigindo as duas atrizes principais, que conseguem entregar o que há de melhor em suas sempre ótimas atuações. As duas atrizes estão cativantes durante todo o filme e conseguem traduzir toda a emoção e cuidado crescente que existe naquela relação. A relação entre elas é o que o filme tem de melhor. Julianne Moore consegue nos mostrar uma personagem que tem momentos relutantes, mas que sempre opta pela coragem de acolher a amiga, mesmo com os olhos lacrimejantes em muitos momentos. Ingrid tem medo, mas decide apoiar Martha.
Apesar de ser um filme sobre morte, sobre eutanásia, sobre o direito de finalizar a própria vida, O Quarto ao Lado é um filme esperançoso, sobre fazer as pazes com o que não dá para evitar. Em vez de ser um filme sobre conflito, sobre tentar fazer Martha mudar de ideia sobre sua escolha de morrer com dignidade, o filme nos mostra uma jornada de vulnerabilidade e respeito, de quem fez as pazes com o seu próprio fim.

